...pois, nota-se pelos olhos que não estás muito bem - conclui, em tom paternalista.
...não, isto é pintado - surge a resposta em jeito de provocação cómica
(silêncio)
Há muito tempo que não era brindada com aquele olhar estupefacto, de quem tenta processar o conceito de que, afinal, aquela particularidade era uma escolha voluntária, não tendo qualquer relacionamento com problemas de saúde, cujos sintomas tinham sido impossíveis camuflar, naquela noite.
...ahhhhh... isso de pintar os olhos de vermelho é muit'à frente ! - tenta-se desculpar pela gafe cometida.
Sorri e continua a conversa, tendo a confirmação de que se encontrava num contexto completamente afastado da sua realidade, onde não só as aspirações de vida como a simples aparência exterior, não podiam estar mais distantes das suas.
Divertia-se, no entanto, com a perfeita noção de que voltara a envergar orgulhosamente o seu "eu", que há tanto ficara dormente e obscurecido pelo papel que foi obrigada a vestir.
O papel que a obrigara a ficar sob as luzes da ribalta, que despertava no espectadores um misto de pena com uma insaciável necessidade de alívio, ao tentar saltarem para o final feliz, mas do qual, agora, como comprovava, se conseguira ver livre de vez.